sábado, 10 outubro 2015 16:56

TEMAS SOBRE TEIMAS

(Comentários sobre um texto do Prof. José Enrique Gargallo Gil)  

 

 

 

    Prof. Dr. António Gil Hernández, da A.A.G-P.

 

22 de Março de 2002

 

 

 

LUSOFONIA: PRINCÍPIO E FIM

 

Como resposta a LusogRafia.org pensei enviar, reescritas, umas velhas reflexões minhas a que pus o cabeçalho «As minhas razões para acreditar na Lusofonia». Ecoam o livro que Rodrigues Lapa intitulou, castelanianamente, As minhas razões. Memórias de um idealista que quis endireitar o mundo... (Coimbra Editora, 1983).

 

No meu texto, que foi publicado em Cadernos do Povo. Revista Internacional da Lusofonia (núm. 5-14, 1988-89, pp. 17-19), começava expor a minha concepção de Lusofonia para delinear as tarefas que hão-de cumprir-se e as condições para a verificar.

 

Desse texto apenas cito aqui alguns trechos, os que julgo estritamente precisos, e que acomodo:

 

1. Entendo por Lusofonia a comunidade integrada por aqueles que podem exprimir-se na língua portuguesa e assim o fazem habitualmente. Porém, a Lusofonia pressupõe determinada concepção da unidade que anima os lusófonos e sobretudo implica o discurso legitimador dessa concepção unitária, que alguns diriam "sentimento". É com a afirmação da unidade que se constrói a unidade; é com a procura de motivações unificantes e não precisamente uniformadoras que o processo de unidade acabará tomando corpo de firmeza. Portanto, condições decisivas para verificarmos a Lusofonia são: quer a vontade, também política, de a realizar, quer a assumpção generalizada do discurso da unidade. Caberia resumir ambas as vessantes numa expressão como «queremos ser lusófonos porque já os somos, apesar das diferenças e por elas mesmas».

 

2. Dentre as Tarefas possíveis assinalo as de reconhecimento, as de ideação e as de organização.

 

Relativamente às primeiras, entendo que o património da Lusofonia reside naqueles grupos que, independentemente da sua adscrição "nacional", quer dizer, estatal, aprofundam e promovem os valores tradicionalmente transmitidos na língua portuguesa, que, aliás, denomino sentimentalidade intencionalmente eficaz, universalidade sempre particularizada e persistência esperançadamente disponível. «Lirismo», «saudade», «descobertas», «retranca»... satisfazem esses valores.

 

Relativamente às tarefas de ideação considero que, perante as tentações de eficácia imediata, de particularização individualista, de disponibilidade veleidosa, a cultura lusófona pode e deve incidir nos valores tradicionais e "inoculá-los", como vacina confortante por doses apropriadas, nas novas gerações, não apenas da Lusofonia, mas também nas integrantes doutras comunidades linguísticas.

 

Relativamente às tarefas de organização, preciso que os cidadãos da Galiza hão-de compreender que, nas circunstâncias atuais, a condição de administrados espanhóis não contradiz, no seio da União Europeia, a sua radical nacionalidade cultural lusófona. A comunicação consciente e medidamente procurara pelos cidadãos dos Sete (mais um) e com eles, o conhecimento ou reconhecimento da história e a ideação de tradições renovadas libertarão da ignorância e da inconsciência, hoje generalizadas, os cidadãos da Galiza como corresponde e estes tempos de rotura de fronteiras.

 

3. Reduzo a duas as condições que possibilitarão o cumprimento dessas tarefas. Uma é a atividade cívica, não precisamente institucional. Hoje as instituições e autoridades, enquanto tais, acham-se indecisas quando não confusas e até desacertadas. É a consciência cívica dos cidadãos, de todos e dos melhores, a construir e organizar plenamente a Lusofonia. Outra condição consiste na definição do instrumento identificador da Comunidade Lusófona, que tem de ser unificador, a manifestar-se numa Ortografia precisamente unificada.

Datava esse escrito em Acrunha, em Dezembro de 1988.

 

CAMINHO ESGRÉVIO, DIVERGENTE SÓ EM APARÊNCIA

Não vou continuar pelos campos da Lusofonia extensa e útil. Porém, examinarei os "eidos" duma paradoxal "galegofonia", cujos cultores, por palavras do Prof. Gargallo Gil que abaixo cito, «no creen viable un reintegracionismo del gallego al portugués», mas buscam praticar um curioso "reintegracionismo a la inversa", a teor do qual umas falas fronteiriças de Cáceres são variedade da língua galega  só, e não da portuguesa. Caberia qualificar de "nacional español" esse "reintegracionismo galegofónico", porquanto sustém que apenas falas "galegas" inclusas no "Reino de España" podem realizar uma mesma  e só língua "española". As outras falas, sem dúvida igualmente "galegas", por se acharem além fronteiras, verificam consequentemente uma língua "estrangeira". Contudo, há um facto que mesmo abala esse suposto "nacional": É o facto de esses mesmos cultores da "galegofonia  española" fornecer a cada grupo de falas, que eles dizem "homogéneas" normas gráficas diferentes. Não é certo que a diversidade [ortográfica] evidencia a diversidade de línguas ou idiomas?

 

ACTAS CURIOSAS DUM CONGRESO SOBRE «A FALA»

Não preciso insistir em que hoje (2002) continuo a opinar como ontem (1988), e ainda mais esclarecidamente, sobre a Lusofonia e sobre as "galegofonias" artificiosas por hoje o caldo de cultura de concepções estranhas ser muito mais espesso.

Com efeito, o movimento denominado "reintegracionista", que outrora parecia procurar a convergência das falas galegas com as portuguesas mercê da adopção da escrita padrão e histórica conservada no português, hoje nos factos está a opor-se progressivamente à Lusofonia, enquanto parece confluir, pelo menos na prática, mais cada vez com os pressupostos em que alicerçam os "reintegracionismos inversos" acima assinalados.

Seja como for, acho que bastantes dessas concepções estranhas se contêm nas Actas del I Congreso sobre A Fala (21 y 21 de mayo de 1999. Eljas, San Martín de Trevejo, Valverde del Fresno), Estudios y documentos sobre A Fala, Tomo VI, Coordinadores: Antonio Salvador Plans, Juan Carrasco González, María Dolores García Oliva, Editora Regional de Extremadura, Mérida, 2000.

Enviou-mas José Enrique Gargallo Gil, professor na Univerdade Autónoma de Barcelona, estudioso de falas «fronteiriças». Agradeço-lhas e, como prova do meu agradecimiento (mas não só), vou comentar tanto algumas dessas concepções estranhas, quanto o caldo de cultura que as abriga, referindo umas e outro à situação da Lusofonia galaica atual.

 

PRIMEIRAS IMPRESSÕES

A impressão imediata, e global, que me produziu a leitura da «Lección inaugural», de Alonso Zamora Vicente, assim como a das sete «ponencias», pode resumir-se nos seguintes pontos:

1. Sobre qualquer outra prevalece o facto de todos os intervenientes no Congresso respeitarem (e acatarem) a ordem, constitucional, estabelecida no "Reino de España". Num Congresso como este não sería, à partida, aceitável uma declaração "institucional" crítica com essa ordem e, menos ainda, oposta a ela. Contudo, dos professores universitários participantes, tomados conjunta ou individualmente, caberia esperar alguma análise, mais ou menos pormenorizada, de todos os factores em presença (ou em ativo), dentre os quais não é menor a [ordem] política e administrativa, principalmente a atual, mas também os sucessivos desde a "origem" em que uns e outros "põem" essas falas "galegas" ou "galaico-portuguesas", que são os que marcaram as fronteiras e, factualmente (pelo menos), suscitaram o nascimento (ou a amortização) destas "falas fronteiriças".

 

2. Sobretudo, as «ponencias» quarta, quinta e sexta evidenciam respeito quase reverencial dessa ordem, justamente porque para (quase) nada referem a situação da "fala" à estabelecida no "Reino de España": Idêntico proceder no estudo (e valorização) das "falas galegas" na «Galicia española».

3. É curioso que, sem quase matizações, a atual ordem administrativa se transponha à distribuição idiomática atual e inclusivamente à precedentes. Sós a sua «ponencia», do amigo e Prof. Gargallo Gil, dum ponto de vista amplamente filológico (de agradecer), e a da Prof.0 García Oliva, do ponto de vista histórico, procuram situar nos parámetros esperáveis o "problema", que na realidade se espalha em problemas de abundantes incógnitas ao longo do tempo, mas que no presente se está reduzindo a quase curiosidade folclórica.

4. Diverte o facto de os partidários da galeguidade da "fala" não colocarem com alguma precisão documental nem no tempo da longa duração, nem menos ainda nalguma mais curta, as falas e/ou línguas em presença ou em litígio ("galego", português, "leonês", castelhano?; medievais, ulteriores, presentes?), simplesmente parecem fiar-se de apreciações não excessivamente fundadas e sobretudo exprimidas sem precisão, dado que "galego" é utilizado não como termo, mas como referência, mais ou menos vaga, a realizações arcaizantes da língua portuguesa que não é raro materializar nas "falas" galegas atuais, também por parte de estudiosos do galeguismo.

Também não dilucidam a denominação atribuível a cada uma das línguas citadas (por ex., "español", meridional septentrional), sempre a respeito da "fala".  

SÓ QUESTÃO DE NOME?

Apesar de tudo ou pelo mesmo, surpreende a importância concedida ao nome pelos autores das «ponencias» quarta, quinta e sexta e, simultaneamente, a sua fugida certa a nenhures para acabarem denominando confusamente o que, aliás, se deu por esclarecido. Eis um exemplo, tirado da nota 11 (p. 151), que compendia o Prof. Carrasco González:

Así lo expreso [gallego medieval aquí trasplantado] recogiendo una doble sugerencia que me hace el Prof. Fernández Rei en el transcurso de las sesiones del Congreso. Por un lado, refiriéndome al >gallego medieval=, o >antiguo= (y no al >galaico-portugués=) no sólo respondo a una perspectiva histórica determinada (que es lícita  y propia de los gallegos), sino que nos permite señalar con claridad el origen específico de los repobladores de Jálama y, por lo tanto, nos da la explicación de las características de estas hablas. Por otro lado, la imagen de que las hablas de Jálama, más que una >tercera rama= del bloque galaico-portugués, fueron una pequeña rama que se cortó del gallego antiguo y se trasplantó a tierras extremeñas, donde pudo sobrevivir autónomamente, nos permite una visión más próxima a la realidad de los hechos históricos que la más tradicional del árbol genealógico de Schleicher.

Seria admissível o uso da denominação «galego», se previamente forem fixadas a conformação do idioma, os limites do território, as condições das gentes, das culturas ou dos costumes, a que corretamente se deva atribuir esse nome e de facto se atribui. Mas «galego» não é denominação exclusiva da Galiza interior atual; também pode referir-se tanto ao território e à gentes da antiga «Galaecia» quanto aos de «Lusitania», por exemplo.

Seja como for, quem preferir aplicar tal denominação a essas falas, hoje da "Extremadura española", há-de se submeter à obriga de precisar o significado e os referentes, a "intensão" e a "extensão" do vocábulo «galego».

 

FACTOS PROVADOS OU QUAE PRO QUIBUS?

Talvez o princípio e fundamento de todo o «descubrimento» (que lhe diz Fernández Rei; em adiante FR.) e de todo o enleio ulterior seja o "achado", longamente perseguido, da "prova" definitiva, por experimental, que justificaria a tese isolacionista. Basta com ler as «ponencias» de Costas (em adiante C.) e do citado FR. para perceber o gozo "científico" que ressumbram.

 

Lembro que à partida sustinham a "tese" indiscutível (>desagregação-diassistémica, em línguas "históricas" diversas das falas "galegas" a respeito das restantes falas da Lusofonia) baseando-se apenas na realização oral: A fala "diferente" implica e explica a língua "diferente".

Porém, cedo advertiram (acho) a fraqueza do argumento, porquanto, se o critério (consideremo-lo tal) fosse "cientificamente" válido, por simples congruência haveria de admitir-se, pelo menos, que a maioria (ou todas) as línguas hoje assim estimadas são na realidade conglomerados não de dialetos, mas de línguas, que, por sua vez, poderiam (e deveriam?) ser "normadas" como línguas independentes. (Como acima indiquei, dessarte procedem os cultores do isolacionismo com os diversos conjuntos de falas "galegas". Declarados previamente homogéneos).

Se a dificuldade teórica é grave, mais grave é a prática. Se "galego" e português são línguas "diferentes" porque se falam "diferente", o mismo deve dizer-se do castelhano e do "andalú" e do "canario" e do "extremeño"..., com o qual a ciência linguística entraria em confrontação aberta com a história política e sobretudo com a ordem constitucional do «Reino de España».

Por esse motivo (e com esse fundamento), os cultores do isolacionismo inverteram a andaina e alicerçaram na história política e na ordem jurídica do «Reino de España» a divergencia oral de "galego" e português. Disseram-nos (e acaso se disseram eles antes): «Como os respetivos falantes pertencem a Estados diferentes e percorreram histórias políticas diferentes, é "vero" ou, pelo menos, "ben trovato" que os identifiquemos como falantes de línguas diferentes».

A incongruência desta inversão no processo argumentativo patenteia-se, sobretudo se temos em conta que a «Escola Filolóxica de Compostela» é filha legítima da «Escuela Española de Filología», da qual foi fundador e patrão D. Ramón Menéndez Pidal. Este Pai da Filologia Românica em diversos escritos de diferente época e público destinatário nega que as fronteiras quebrem de facto ou tenham de quebrar de iure a unidade da língua. Decerto, quando enuncia tal princípio, está a referir-se à «lengua española»; mas, se essa doutrina, também filológica, é válida para o "español", deve sê-lo para qualquer outra língua, incluído o português na Galiza.

Enquanto o caminho da oralidade terminava sempre num beco sem saída, os cultores do isolacionismo excogitaram aquilo do «galego, lingua por elaboración». Tentavam basear-se, parcelarmente, nas reflexões sociológico-classificatórias de Heinz Kloss e nas subseguintes do romanista (e sociolinguísta) Zarco Muljacic. Mas não advertiram (ou sim) que, procedendo por esse caminho, prescindiam do caráter pragmático das classificações de ambos os professores. Estes exprimiam o que era; apenas sob hipótese referiam-se ao que devia ser e menos ainda forneciam algum critério para mudar a classificação vigente das línguas da Europa e das românicas sobretudo. De facto o Prof. Muljacic coloca o "galego" em dous quadrinhos que se correspondem com as duas correntes em lida: o "galego" como forma de português  e o "galego" como língua isenta.

Se umas falas se fazem corresponder com uma determinada «ortografía» que, à partida, foi "elaborada" divergente da ortografia que se utiliza para a língua à qual aquelas falas se vinham adscrevendo, e, além disso, se essa ortografia divergente se toma como evidência da diversidade entre as línguas matriz e a "elaborada", decerto "cumpre" concluir que tais falas se tornam "cientificamente" em língua "diversa".

Por outras palavras, diretas: Se, à partida, os cultores do isolacionismo decidem que as falas "galegas" constituam uma língua distinta da matriz portuguesa e colocam esta condição na divergência gráfica, vale-lhes "elaborarem" uma grafia "divergente" para que as falas "galegas" mecanicamente se "tornem" em língua diversa, segundo dizem, «de seu».

Ora, quem assim procede, pratica o erro lógico denominado tradicionalmnte petitio principii ou círculo vicioso, nada científico com toda a certeza.

 

Como sem dúvida tais cultores terão advertido (acho) que se achavam incursos nesse erro lógico, anticientífico, procuraram ultrapassar a fraqueza do argumento, que intitulavam (como disse) "galego, lingua por elaboración", mercê de um "círculo virtuoso" que construíram sobre o achado de falas "galegas" na «Extremadura española», a seu ver, experimental e portanto definitivamente probatório. Interpretam que, pelo acusado (ou atribuído) arcaísmo e mesmo por serem "dislocadas" do seu território de origem, devem tomar-se como evidência lídima de o "galego" fruir a condição, imemorial e fontanária, de língua isenta relativamente ao português.

 

A "fala", prova definitiva da "isenção galaica"?

Examino, como se fosse observador inocente, esse achado. Antes de mais, invadem-me várias dúvidas, razoáveis, além da apontada acima sobre o conceito e extensão do apelativo "galego". Concedo que a "fala" da «Extremadura española» é "galega", mas a seguir questiono os factos aduzidos por não suficientemente provados:

1. A "fala" foi transferida em tempos remotos (séculos XII e XIII), durante os reinados de Fernando II (1137-1186) e Afonso IX (1171-1230) de Leão. Mas cabe determinar com alguma aproximação a data da translação ou translações?

2. Se fosse possível assinalar uma data, poderia fixar-se a procedência ou as procedências dos portadores da "fala"? Ambos os dados são preciosos para conhecer os traços da "fala" original de modo a compará-la com os atuais tanto da "fala" de «Extremadura» quanto das correspondentes da Galiza.

3. Além disso, indubitavelmente, apesar do isolamento (ou mercê dele), a "fala" evoluiria não necessariamente no mesmo sentido que as originárias. Como é que poderíamos estabelecer os procedimientos adequados para comprovar e comparar as respetivas evoluções ou «derivas naturais», que dizem os isolacionistas?

4. Tanto a "fala" de «Extremadura» quanto as "falas" da Galiza terão «derivado» submetidas à influência do castelhano oficial que os "falantes" receberiam, muito desigualmente, durante os sete ou oito séculos... Mas por que procedimento poderia medir-se essa influência singularmente em cada  momento da história?

5. Pelo seu lado, a "fala" de «Extremadura», dada a situação, terá recebido influência desigual do português e do castelhano (e do leonês), sobretudo da realização oral desses idiomas nos lugares vizinhos. Cabe supor que um e outro (e outro) têm incidência equivalente na «deriva natural» a qual, desse modo, ficaria interrompida ou deturpada? Como valorizaremos essa interrução ou deturpação?

6. Além disso, supõe-se que a "fala" também receberia a influência, mais ou menos indireta, do português padrão. Até que ponto essa influência pôde "torcer" a «deriva natural» da "fala"? Como poderia medir-se quantitativa e qualitativamente a sua intensidade?

7. Desde que foi implantado o serviço militar obrigatório, que influiria na "fala" dos varões, e desde que a escolarização foi obrigada, como pode caraterizar-se a inflexão do castelhano oficial, escrito, sobre a oralidade dos "falantes"? Ainda mais, qual pôde ser a incidência dos meios massivos de comunicação na «deriva natural? da "fala"?

Em soma, muitos foram os factores que puderam reconduzir a «deriva» da "fala", que sem dúvida a reconduziram. Mas como e quanto, ao longo do tempo?

 

TRAÇOS FACTUAIS

A meu ver, o mais razoável não é deambular por hipóteses mais ou menos prováveis, mas se estear nos factos, nas realizações atuais da "fala", nas orais, que haverá de comparar com as realizações orais, tanto galegas estritas (?) quanto portuguesas, próximas aos "lugaris" e mais longínquas.

 

Com efeito, segundo apontei acima, não há constância indubitável nem da origem das gentes que repovoassem esses "lugaris", nem, menos ainda, se conhecem com certeza as realizações orais das falas de aquelas gentes. Por outro lado, segundo faz FR., haverão de comparar-se com o português padrão, não só, mas também e sobretudo com o castelhano (ou «español»), oral e escrito ou normativo, porquanto o contato (?) ou, mais bem, a imersão dos "falantes" na língua nacional do «Reino de España» tem sido regra desde que se tornaram obrigados o serviço militar e a escolarização.

Essa comparação conduzirá as explicações adequadas e ajudará a extrair as consequências pert­nentes para falsar a [hipó-] tese isolacionista.

À partida, considero válidos os factos de fala que expõe FR. no apartado 3., "Trazos galegos das falas de Xálima", da sua «ponencia». Permito-me comentá-los pontualmente.

3.1. "Trazos comúns á xeneralidade das falas galegas", entre os quais, por sua vez, distingue:

[3.1.1.] "comúns á xeneralidade dos actuais falares galegos e portugueses", quer dizer, cuja «deriva natural», de todos eles, não foi divergente. Entendo que são «trazos» não diferenciais ou distintivos, de modo que nada provam -são, digamos, a maior abundamento para evidenciar que a "fala" não tem origem singular, mas comum, galaico-portuguesa.

FR. cita, parece que como ejemplos, sem procurar a exaustividade:

a) "a ausencia de ditongo" /ué/, /ié/, que não identifica com a abertura da vogal não ditongada /o/, /e/;

b) "a presencia de ditongos decrecentes" em que cumula o de evolução comum ou > oi: outro > oitro, pouco > poico e o de evolução particular da "fala" eu> ei: eu> ei, meu >mei.

Se me for permitido abusar da via probatória que FR. transita, esse traço provaria mais bem a portuguesidade da "fala" e não a sua galeguidade.

c) "o mantemento de F- latino".

d) "a perda de -L- e de -N-", que exemplifica com vozes que, na maioria das "falas" galegas (tenha-se isto bem presente), foram substituídas pelas castelhanas (coellu / conexo; ceal / cenar).

Quer dizer, é traço que se explicaria tanto por arcaísmo quanto por base portuguesa.

e) "a reducción das xeminadas -LL- e -NN-".

f) "resultado [] dos grupos -LJ-, -KL- e -G=L-".

Se a realização fosse a que diz FR, este traço provaria mais uma vez a portuguesidade da "fala" mais do que a "galeguidade", porquanto o "galego" atual (pode generalizar-se) é "yeista", sem dúvida por pressão, direta o indirecta, do castelhano "normativo".

[3.1.2.] "Outros fenómenos [...] son caracterizadores das falas galegas" e das portuguesas septentrionais. Por essa parte, continuamos na dúvida da procedência dos supostos repovoadores.

a) "inexistencia da oposición fonolóxica entre a bilabial /b/ e a labiodental /v/".

b) "mantemento da africada prepalatal [t]".

c) "terminación -eu, -ea" en adjetivos y substantivos.

d) "terminación -o [u] na P3 dos perfectos fortes".

e) "radical fag- de formas verbais".

f) "a forma impersoal hai de haber".

g) "radical viñ- no tema de perfecto de vir".

[3.1.3.] "[...] fenómenos da rexión de Xálima que son propios do galego fronte ó portugués, incluídos os falares septentrionais". Entendo que é afirmação excessivamente atrevida. Os traços que FR. cita como exclusivos do "galego" são comuns nas "falas" septentrionais até ao Porto (e ainda mais).

a) "ausencia de fonemas vocálicos nasais".

 

Ao caso digo mais: Os supostos fonemas nasais não se podem atribuir, como distintivos, ao português padrão. Segundo Jorge Morais Barbosa e Antonio Quilis devem fonologicamente analisar-se como "vogal + elemento nasal"; mas essa é análise que corresponde às vogais nasaladas tanto nas falas "galegas" quanto inclusiva ou principalmente nas falas do castelhano do sul (ou «español»), quer andaluzas, quer muitas americanas.

b) "existencia do fonema nasal velar" (nh).

c) "alomorfo lo(s), la(s) en sintagmas como agarralo cabalo, propio da maioría dos falares galegos".

d) "contraccións ó, ós resultantes do encontro da preposición a e o artigo, xerais en galego".

3.2. "Xálima, >maqueta= do galego dialectal":

Por fim FR. coloca-nos perante os fenómenos reduzidamente "galegos" e "dialectais" da "fala". Vejamos a força probátoria. Lembro que a hipótese de partida é que a "fala" realiza o diassistema linguístico galego, o qual, à partida, se tem apresentado como diverso idiomaticamente do diassistema português.

[3.2.1.] "Fonética"

a) "en Valverde hai un sistema semellante ó dos falares galegos non seseantes que é o maioritario no galego oral".

Quer dizer, o sistema consonântico medieval reduziu-se tanto na Galiza quanto nestes "lugaris". Esse é facto indiscutível, mas deve referir-se a outro facto, também indiscutível: O sistema de sibilantes historicamente é o mesmo do castelhano, até ao ponto de que tanto em galego quanto na "fala" surge um som (ou fonema?) estranho, o castelhano atual e "normativo" /x/. Em consequência, será possível negar que foram a escola e a milícia, espanholas, os factores decisivos na reorganização estrutural desse subsistema consonântico "galego"?

Topamo-nos com o fenómeno da "gheada", mais ou menos avançado, que os isolacionistas fundamentam ideologicamente na evolução interna, improvável, da língua e não na observação e interpretação do estado social e político em que, no «Reino de España», se acham os falantes de "galego" desde o século XVI sobretudo. Valverde, diz-se-nos, é o lugar menos isolado ou mais submetido à influência do castelhano oral e escrito.

b) "Nas Ellas e en San Martín hai un sistema arcaico de sibilantes que lembra, en certo modo, o de falares galegos da Limia Baixa ourensá e o de Hermisende nas Portelas de Zamora": /¥/, //, "oposición característica do portugués moderno fronte ó galego".

c) "A interdental" desaparece sempre en posición implosiva final nos tres lugares. [...] "O fenómeno xa fora salientado por Maia (2001) ó referirse conxuntamente á perda de -s (ou -z) final de palabra", sem dúvida "por influência dos vizinhos falares espanhóis da Extremadura". Fernández Rei assinala que deveriam distinguir-se ambos fenómenos, já que "[n]o galego zamorano de Porto e en puntos espallados de Ourense rexístranse for­mas sen -z  (vo, no, cru, capá, rapá)".

d) "Hai solucións de Xálima que son características do galego oriental, particularmente de puntos do Bierzo e  das Portelas de Zamora, así como de zonas de Ourense próximas".

FR. exemplifica: cutelo, escutar, truta e luta, que reconhece "semellante[s] á[s] portuguesa[s]". Melhor seria que reconhecesse que são as do português patrão ou comum.

[3.2.2.] "Morfoloxía nominal e pronominal"

a) "No plural das palabras oxítonas rematadas en -n [...] rexístrase a solución -ns do galego occidental [...] en Valverde (ladróns, razóns, folgazóns) e a solución -s do galego central nas Ellas e en San Martín (lairós, radós, folgazós)".

Bom: até aí nada de particular. Contudo, acontece que infere de mais, com desconhecimento ou precisão dos factos dialetais do português, não só continental ou europeu, mas também do americano e do africano. O próprio FR. é cônscio de tal excessiva inferência quando, depois de afirmar "esta formación de plural á galega (e non á portuguesa)", corrige: "que non son descoñecidas dalgúns falares trasmontanos", sem dúvida portugueses.

 

b) "Nas palabras polisílabas en -l a solución xeral é -is en Xálima (animais, papeis, cuadís, españois, azuis/ aduis), como en portugués e galego estándar".

Não me resisto a apontar que FR. joga com duplo baralho ou com as cartas marcadas, ao seu arbítrio. Entendo que à partida ele (e otros isolacionistas) se propunham demonstrar o facto de "fala" de «Extremadura» ser "galega" e não portuguesa, quer dizer, que os fenómenos distintivos da "fala" os são também de "falas" de territórios interiores ou exteriores à «Comunidad Autónoma de Galicia», mas, em todo o caso, integrantes do «Reino de España». Para provar essa [hipó-] tese, dizem comparar, uns e outros, com os traços distintivos das "falas" portuguesas.

Portanto, não é teoricamente nem correto nem consequente (ou lógico) referir factos de fala (mais do que "fenómenos") com preceitos pontuais da norma padrão, tanto portuguesa quanto "galega". Pertinente, neste aspeto, é a observação imediata de FR:

"No galego dialectal [= nas "falas" galegas] esta solución [en -ais] só é propia de falas orientais"

(e nem isso, já que nestas é frequente -ás en connivencia con -ales.)

Se os isolacionistas fossem cientificamente lógicos, tomariam esse facto de fala como o que deveras é, como prova do processo, comum à "fala" e às falas galegas, de castelhanização progressiva, que, imediatamente, contrastariam com a não-castelhanização das falas portuguesas. Corrobora-o a informação com que acaba o parágrafo: "Así e todo, rexístrase cuais nun texto valverdiano de comezos de século (Costas 1992 b: 91)."

c) O apontado sobre as terminações -anu, -ana nem prova nem "desprova" a hipótese de partida. Pôde poupar o parágrafo.

d) "Nos pronomes átonos non hai distinción te e che propia da maioría das falas galegas".

Curioso: O facto provaria que a "fala" evoluiu como as falas do Portugal contíguo. Mas é que o facto não é distintivo das falas galegas, como reconhece FR, mas do «galego estándar», que só em segundo termo caberia considerar.

Mais curioso ainda: "O teísmo de Xálima [...] ten un correlato nas formas sen palatalizar le, les." Não vale explicar o "fenómeno" desde o referido processo de castelhanização manifesto na "fala"?

[3.2.3.] "Morfoloxía verbal" etc.

Sobeja continuar. Os fenómenos apresentados como distintivos provam, um a um e em conjunto, tão pouco a exclusiva galeguidade da "fala" que tornam ocioso o exame mais democrado.

 

ALGUMA CONCLUSÃO?

Na parte conclusiva da sua «ponencia», FR. cita um texto de C. (1999 a: 88):

«Tanto Frías coma nosoutros estamos convencidos da "galeguidade" innegable destas falas, galeguidade por orixe e galeguidade de as compararmos cos resultados actuais das variedades galegas do sueste do noso dominio lingüístico. Gargallo Gil, gran estudioso das falas arraianas da península, acabou por admitir que efectivamente, dentro da singularidade das mesmas, a vinculación coas falas galegas é moito máis evidente que coas portuguesas, por máis que formen parte todas do mesmo diasistema lingüístico. Para Carrasco González, profesor de portugués na Universidade de E[x]tremadura, estas falas son unha póla á parte dentro do galego-portugués, a terceira póla da familia.»

A meu ver, C. e FR. não repararam na importância da expressão "forman parte todas del mismo diasistema lingüístico", que, crítica ou acriticamente considerada, desvirtua a [hipó-] tese de "galego" e português, desde os tempos medievais, serem línguas diversas. Dessarte se permitem pôr o Prof. Gargallo Gil como testemunha em prol dessa [hipó-]tese.

 

É por isso que, nas linhas que seguem, me permito percorrer o contributo do Professor ao Congreso sobre A Fala para comprovar que, filologicamente, a presunção de C. (e FR.) joga com médias certezas, inaceitáveis (ou impresentáveis?) onde quer que se procure algum grau de cientificidade. Na «ponência» que comento o Prof. Gargallo Gil escreve:

«Y vuelvo a la cuestión )Se habla gallego en Extremadura? Ese título he dado a otro trabajo mío (Gargallo 2000), donde sopeso las razones de quienes pretenden que sí. Razones históricas (repoblación medieval con colonos mayoritariamente gallegos) y razones basadas en la afinidad con el gallego propiamente dicho. Y no deja de sorprenderme que quienes no creen viable un reintegracionismo del gallego al portugués, practiquen en cambio este curioso "reintegracionismo a la inversa", según el cual no es el gallego la misma lengua que el portugués, pero sí es una variedad de la lengua gallega (y no de la portuguesa) este "gallego" de Cáceres.»

 

TRÊS PROBLEMAS OU VESSANTES

Nesse contributo ao Congreso sobre A Fala o Professor aborda sucessivamente três problemas ou vessantes relativos à questão em lida: «)Pode considerar-se "galego" a "fala" da «Extremadura española»? Metodicamente parece-me correto esse proceder, que vou seguir:

  «

1. QUE "GALEGO"?

Acertadamente começa perguntando:

«)"Gallego" o "variantes/variedades [também prefiro "variedades"] del antiguo gallego-portugués"? No me parece que lo uno y lo otro sean lo mismo. Porque son variedades resultantes del antiguo gallego-portugués tanto el portugués como el gallego actuales y ambos romances constituyen sin duda para Costas (y otros filólogos gallegos) idiomas por separado» (pp. 56-57)

Parece-me acertado, digo, mas também convém tomar como ponto de partida o factor, a meu ver decisivo, que venho assinalando: É a ação envolvente e institucional do «castellano» não tanto sobre as falas galegas e «extremeña» (que também), mas sobre os sujeitos transmissores e sobre as condições sociais, culturais, económicas e políticas em que as transmitem. Rodrigues Lapa, num determinado momento, chegou a dizer que o galego evoluido livremente é o português atual. Eu não chego a tanto. Singelamente assinalo o facto de as falas galegas e «extremeña» terem sido por séculos para os seus utentes apenas falas, sem língua de cultura própria, excepto a castelhana, idiomaticamente alheia, enquanto as falas portuguesas sempre dispuseram de língua de cultura própria, mais ou menos intensamente presente, mas sem solução de continuidade, nem no período filipino sequer.

Esse facto duradoiro autoriza o investigador a inferir que o resultado, num caso e noutro, devam ser línguas diversas? Acho que não. Seja como for, o que o filólogo ou linguísta (não digo o sociólogo da língua ou o sociolinguísta ou o "glotopoliticista"), se procura alguma consistência teórica, teria de fazer antes de emitir essa conclusão é analisar comparativamente umas e outras falas, insisto, as realizações orais.

Quem assim as analisar talvez conclua (só inicialmente?) que as falas galegas não constituem uma «lingua de seu», mas que, ao longo dos séculos, percorreram o trajeto que vai de ser expressão de autonomia idiomática à crioulização factual entre a língua de origem, galaico-portuguesa, e a envolvente, castelhana ou, antes, «española». Ainda mais, essa crioulização, por sua vez, dada a situação, perceptível em bastantes falas e falantes, é trânsito, também factual, à dialetalização ou simples variedade sinstrática da língua nacional do «Reino de España».

Cumpre acrescentar, à margem, que a "normalización" tanto de corpus, elaborada pelos isolacionistas, quanto de status, abrigada sob as instituições «españolas»Junta de Galicia», «Diputaciones», «Ayuntamientos», ...), não evita esse processo, mas, tudo o contrário, está a promovê-lo em progressão geométrica.

 

2. SENTIMENTO DOS "FALANTES"

 

O Prof. Gargallo continua (p. 57), como se respondendo as perguntas «Que opinam os "falantes", sujeitos diretamente implicados?» Quer dizer: «Qual é o sentimento dos utentes sobre a sua "fala"?, consideram que falam "galego"?».

"[...] no estoy tan convencido de que una buena parte de la población de los tres lugares respondiera afirmativamente (y sin matizaciones) [...]. Tampoco puedo asegurar que compartieran con gran entusiasmo el aserto de Costas (1999: 84) de que el valle en que reposan los tres lugares «[...] é coñecido como Aa Galicia estremeña@».

O "argumento" do sentimento dos falantes teria, para o caso da "fala", a mesma pertinência que os isolacionistas, citados, lhe atribuem para alicerçar a sua [hipó-] tese da diversidade idiomática de "galego" e português.

Com efeito, os isolacionistas toman, como fundamento cientificamente válido para inferir a diversidade idiomática de "galego" e português, o sentimento (ou «conciencia») dos falantes de falas galegas que sentem o facto, aliás evidente, de não falarem português, em particular, português padrão.

Em consequência, se estimam válido esse "argumento" para justificarem a "não-dependência" do "galego" a respeito do português, teriam de validar com igual força probatória o sentimento dos falantes da "fala" da «Extremadura» para não a tornar dependente do "galego". Mas, ao não procederem com essa lógica, evidenciam, também por este lado, a inconsistência teórica do isolacionismo que sustentam com unhas e dentes talvez, mas com escassa ciência.

 

3. FALAS DO BLOCO ROMÂNICO GALEGO-PORTUGUÊS

Coincido com o Professor Gargallo Gil em afirmar que vale tomar este como argumento filológica ou cientificamente válido, a ponderar com adecuação e prudência. Como a sua exposição me parece determinante (embora comedida: demais?), sigo-a, levemente comentada pela minha parte. Começo pela citação de uma passagem extensa:

      Es indudable [...] que dichas hablas forman parte del bloque románico gallego-portugués. En eso creo que (casi) todos los filólogos que nos hemos ocupado de ellas [...] estamos de acuerdo. De la profesora portuguesa Clarinda de Azevedo Maia, y concretamente de su modélico estudio sobre Os falares fronteiriços do concelho do Sabugal e da vizinha região de Xalma e Alamedilla [1977], extraigo una cita, referencia clave para el desentrañamiento de la entidad lingüística de nuestro enclave [...]. Ahí va la cita, tantas veces socorrida. (p. 58)

[...] a linguagem essencialmente galega dos foros de Castelo Rodrigo e dos falares da região de Xalma teriam a sua origem e explicação nos repovoadores galegos da região nos séculos XII e XIII [...]

Aunque entreverada de leonesismos, la antigua lengua de los Foros, como la actual de Xalma, respondería a una hechura esencialmente gallega. Las hablas de San Martín, Eljas y Valverde serían, pues, una prolongación de aquel tipo de lengua rayana, traída a la región por un contingente de repobladores en su mayoría gallegos.

Tal es, en esencia, el argumento histórico que esgrimen ahora quienes, con Costas, sostienen la galleguidad de mañego, lagarteiro y valverdeiro. Ahora bien, este histórico argumento entiendo yo que se habrá de contextualizar en la conjunta (y secular) historia del bloque románico gallego-portugués, que invita, según mi parecer, a otros argumentos.

Argumentos que no tienen por qué excluir aquél, pero que lo matizan y enriquecen. Para empezar, creo que una cosa será la procedencia de un tipo de gallego antiguo, y otra (bastante otra), que lo que hoy se habla en el valle sea (tout court) gallego. [...]

No sólo habría que considerar las razones históricas [...]. Al argumento histórico vale la pena sumarle el de la afinidad actual entre el romance gallego (del noroeste peninsular) y estas otras hablas romances (del noroeste extremeño). Leamos lo que escribe Costas [...] al respecto (p. 59):

Tanto Frías coma nosoutros estamos convencidos da "galeguidade" innegable destas falas, galeguidade por orixe e galeguidade de as compararmos cos resultados actuais das variedades galegas do sueste do noso dominio lingüístico [...]


Su convicción de tan innegable galleguidad lingüística, por origen y por actual afinidad, la comparto sólo a medias, con los matices que (a mi modo de ver) impone la contemplación de todo el complejo lingüístico gallego y portugués, en su dimensión histórica y actual. [...]

Y esto último es lo que sigo creyendo. Que unas y otras hablas (gallegas, mañega, lagarteira y valverdeira) forman parte del mismo mundo lingüístico gallego-portugués ("diasistema", lo llama aquí Costas). Y persisto asimismo en creer que nuestro enclave extremeño muestra en conjunto más afinidades con el gallego que con el portugués inmediato. Y admito de buena fe lo que Costas (buen conocedor de lo gallego) advierte sobre la especial afinidad con el sudeste de su dominio lingüístico gallego. (p. 60)

A meu ver, o Professor assinala vessantes não apenas adscrevíveis à Linguística estrita, desde os quais se deve encarar a questão, enunciada no título da «ponencia»: «)Se habla gallego en Extremadura? y otras cuestiones, no menos delicadas, sobre romances, gentes y tierras peninsulares de frontera (con sus nombres)».

Com efeito, é antes de mais «cuestión delicada», pelo particular nominalismo em que militam os cultores do isolacionismo, de que se gabam e com que contagiam extensamente até aos mesmos "lusistas". Mas também lhes serve de ecran ou de máscara e disfarce para ocultarem as vessantes pertinentes, que, porém, devem ser tratadas com seriedade, porque se acha em jogo não a prolongação de uma «lingua de seu», mas a identidade cultural e pessoal de numerosos cidadãos, hoje europeus, menos submetidos (idealmente) à "moderna" ditadura dos limites administrativos e mais livres para estabelecerem as relações humanas que preferirem.

Comento já a citação:

a. Diz: «Es indudable [...] que dichas hablas forman parte del bloque románico gallego-portugués.» Este me parece que tem de ser o ponto de partida: O filólogo sério teria de começar por remeter as diversas realizações orais em lida à língua histórica que hoje conhecemos pelo nome de português, à margem de os utentes serem cidadãos da República portuguesa ou do «Reino de España» e, neste, da «Comunidad Autónoma de Galicia», do «Principado de Asturias», de «Castilla y León» ou de «Extremadura».

Se o filólogo alcançar a certeza enunciada pelo Professor, o lógico será que aplique a essas falas o critério de correção idiomática universal nestas partes da Europa, nomeadamente à falas que indiscutivelmente se adscrevem ao castelhano-«español» ou ao português.

b. Continua: «Aunque entreverada de leonesismos, la antigua lengua de los Foros, como la actual de Xalma, respondería a una hechura esencialmente gallega. Las hablas de San Martín, Eljas y Valverde serían, pues, una prolongación de aquel tipo de lengua rayana, traída a la región por un contingente de repobladores en su mayoría gallegos.» Já me referi acima à repovoação indubitável, imprecisa. Por isso a observação que a seguir faz o Prof. Gargallo Gil é pertinente: «este histórico argumento entiendo yo que se habrá de contextualizar en la conjunta (y secular) historia del bloque románico gallego-portugués».

Opino, como acima apontava, que, segundo o Professor insiste (p. 61), a «cuestión crucial» não apenas «para el gallego moderno», mas para a "fala" é «la de su status con respecto al portugués.» O isolacionismo sustenta que «desde unha perspectiva sociolingüística e socioliteraria [...] na actualidade galego e portugués son dous idiomas afíns, pero diferenciados».

Cabe concordar com que as razões fornecidas, que acima esbocei, são filológica e linguísticamente válidas? Se a «perspectiva sociolingüística e socioliteraria» se impõe à «realidade dun continuum lingüístico de Ortegal ó Algarve» (que na mesma p. 61 se cita de FR), cumpre esclarecer a real natureza dessa perspetiva, que o Professor explica (talvez com alguma retranca) umas linhas abaixo, quando se refere à localização administrativa de Hermisende (Zamora):

"si esta localidad hubiera permanecido en Portugal (como hasta 1640), si siguiera aún hoy del lado portugués de la raya, )habrían llegado a considerar gallega el habla de Hermisende quienes actualmente la tienen por tal?"

E continua imediatamente:

 

Es evidente que la pertenencia a uno u otro lado de la raya (Portugal / Galicia o Zamora [desculpe-se-me, a oposição correta e adequada é: «Portugal / España+, como o Professor reconhece na nota 18]) se erige en argumento de gran peso [yo diría "definitivo"] a la hora de encuadrar, del lado gallego o del portugués, hablas bien afines, inmersas en un continuum romance (del Ortegal al Algarve) mucho más homogéneo sin duda que el comprendido entre Fisterra y el Véneto italiano. (pp. 61-62)

 

A conclusão que o Prof. Gargallo alcança e que faço minha é inabalável:

 

Para quien contempla el conjunto de lo gallego y lo portugués con talante integrador (o reintegracionista), es bizantina cuestión, por innecesaria, la de si Valverde, Eljas y San Martín hablan gallego o portugués. Portugués o gallego, aun si la afinidad es mayor con éste que con aquél, todo forma parte de la misma lengua (gallego-) portuguesa (p. 62).

 

Preencho essa conclusão com outro trecho seu, da p. 63, em que comenta, questiona ou se surpreende:

 

«si el habla de nuestros tres lugares es (más o menos) gallega, )debería escribirse a la gallega, según la normativa del gallego oficial? La propuesta normativa de Costas [...] iba por ese camino. Por el de reintegrar (en la forma escrita) la fisonomía del "gallego de Extremadura" a la del gallego común. Desde la perspectiva (lejana) de mi naciente peninsular, contemplo con cierta curiosidad (y hasta a veces con un tanto así de perplejidad) la pretensión de un nuevo reintegracionismo. No se trata del ya conocido, que procura la comunión lingüística con lo portugués, sino de una suerte de "reintegracionismo a la inversa". Según este otro planteamiento, no pertenecen a la misma lengua (gallego-portuguesa) las hablas que quedan al norte y al sur del Miño/Minho, por más vecinas que unas de otras sean, por más afines que llegaran a considerarse las unas y las otras. Y en consecuencia han de escribir distintamente su(s) lengua(s) los hablantes "miñotos" de ambas riberas. Pero sí son del mismo idioma gallego tanto el habla compostelana como las de San Martín, Eljas y Valverde. Y se habría de perseverar en que mañegos, lagarteiros y valverdeiros acabaran (o acaben) por escribir de acuerdo con una normativa afín a la del gallego oficial. (p. 63)

 

Umas últimas (derradeiras) precisões:

 

1.0 No «Reino de España» nenhuma das «lenguas españolas» tem ortografia oficial, ditada por Decreto ou Lei. É distintivo da Hispanofonia, de que o «Reino» é cabeça e antemural, face, por exemplo, à Lusofonia e à Francofonia. Se esse facto se tivesse em conta por uns (isolacionistas, incluida a «Junta de Galicia») e por outros ("luso-reintegracionistas"), a «pax graphica» seria também facto, realidade respeitada por todos, a começar pelas diversas autoridades competentes do «Reino de España».

 

2.0 Disse acima "luso-reintegracionistas", mas com alguma licença pela minha parte. Hoje existem, dentro do chamado "reintegracionismo", duas tendências e práticas diferentes e por vezes, de mais, divergentes: A dos que, desde uma «perspectiva sociolingüística» e «socioliteraria» até, sustêm que o português não pode ser utilizado na «Comunidad Autónoma de Galicia» e a dos que entendemos que não apenas se usa sem existir rechaço social, excepto o dos "muito informados"". Acrescentamos: Que quanto mais se demorar o seu uso mais dificuldades haverá para o "reintegracionismo" se [re-] naturalizar entre a gente galego-utente.

 

3.0 Penso que os tempos são chegados para entendermos e explicarmos os factos linguísticos da Galiza mais precisamente. Com efeito, acham-se confrontadas duas propostas muito desiguais: Uma, institucionalmente imposta, cujo objetivo (único?) se reduz a que as falas galegas não sejam "transcritas" a meio da ortografia portuguesa (que é a galega histórica e tradicional) e outra, extra-institucional, que, como acabo de dizer, a prática divide, ainda que alguns estimem teoricamente unida.

Mais nada por agora. Um abraço, se lograste chegar aqui.